As relações familiares estão muito diferentes do que eram no século passado, e isso nem foi a tanto tempo assim; para falar sobre pais, sobre o dia dos pais, passei a refletir os modelos de pais que tinha a minha disposição, primeiro meu pai, meu avô materno e meu marido, além de outros tantos pais que conheci, quer como amigos, quer como clientes, quer como pais de filhos das minhas clientes. Os tipos são os mais diversos, mas o que mais me chama atenção é que a paternidade do século XX, se era apresentada como um papel muito bem definido, nessa segunda década do século XXI é um papel a ser construído.
No século passado, o papel que meu avô materno e que meu pai exerciam era muito claro e delimitado, assim como o de outros pais: não se esperava que eles ajudassem em casa, nem nos afazeres domésticos, nem na educação secular ou religiosa dos filhos, nem que fossem “brincalhões”. Era necessário apenas ser o pai provedor, e sua função era quase imperial, ninguém contestava, apenas respeitava. Para os filhos era uma loteria, se tivessem pais honestos e bem quistos era o melhor dos mundos, nisso tivemos muita sorte minha mãe e eu. Para os netos e os bisnetos que pouco conviveram com eles ficam suas histórias de tanto que as contamos, pois afeto verdadeiro não se rompe com a morte, ele permanece de uma forma diferente.
Daí chegamos ao século XXI, em que as famílias estão em diversos tipos de construção, chamadas de famílias mosaico, onde pais e mães nem sempre são um casal, há padrastos, há madrastas, há filhos de casamentos anteriores de cada parte, ou de uma delas, há famílias monoparentais (pai ou mãe que criam sozinhos seus filhos), anaparentais (sem pai, sem mãe e avós ou tutores criam os menores) e muitas inovações jurídicas foram sendo reconhecidas, pois primeiro a sociedade vai mudando e o direito vai acompanhando o que já acontece na prática.
Hoje há proteção para pais que são alijados de estarem juntos com seus filhos, a chamada alienação parental, muito prejudicial para os filhos. Há o direito de os pais terem a guarda compartilhada como regra, porque a unilateral dá pouca chance de convívio entre o genitor que não a tem e seus filhos, no melhor interesse da criança ou do adolescente. Tudo porque não há mais um papel definido de como tem que ser um pai, de como tem que ser uma mãe. O que mais se valoriza hoje é a afetividade, ainda que reconhecida, mas muito ainda a ser fortalecida e há muito o que se avançar, especialmente na mentalidade de pessoas que ainda pensam no formato do século passado.
O afeto é fundamental para criar vínculos.
Assim, acreditamos que o papel de pai tem que ser construído, dia a dia, com afeto, com contato de abraços (bom para liberar a oxitocina, hormônio do amor), com atenção, com respeito à criança e ao adolescente, com exemplos cristãos, algo que não mais ser só uma obrigação da mãe. É fundamental que o pai preencha seu espaço na vida dos filhos.
E o que dizer da paternidade socioafetiva? É o maior amor que conheço, porque uma paternidade ou uma maternidade socioafetiva é uma doação de um amor ágape, que se escolhe dar, que se distribui para um(a) filho(a) que se escolhe e que daquele momento em diante será seu também. Aprendi tudo isso com meu marido e meus filhos.
Mais um exemplo de valorização do afeto é a paternidade multiparental, reconhecida e agora facilitada pelo Direito brasileiro, possibilitando que haja mais que um pai e mais que uma mãe na filiação de uma determinada pessoa, sem a exclusão da filiação biológica, ao contrário do que ocorre na adoção convencional. Esse reconhecimento pode ocorrer de forma administrativa, por testamento ou via judicial.
Enfim, com a necessária revisão dos modelos paternais do passado, e com o avanço de novos modelos socioafetivos, juridicamente aceitos, certamente teremos relações mais profundas entre pais e seus filhos, formando com isso pessoas mais amadas e completas.
Artigo publicado originalmente no Mensageiro, Boletim Semanal da Catedral Metodista de Piracicaba - SP, p. 03, de 11.08.19, nº 790, ano XLI.
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